25 de dez. de 2010

Hipertensão x Alcoolismo

Na saúde pública, uma das questões mais preocupantes, são as doenças cardiovasculares que representam a primeira causa de morte no Brasil. Destes problemas do coração, muitos são consequências da hipertensão arterial. De acordo com o Ministério da Saúde, 35% da população brasileira, acima de 40 anos, sofre de hipertensão.

Conhecida como "pressão alta", a doença é tida como traiçoeira porque não apresenta, necessariamente, sintomas. Dependentes de álcool são alvo fácil, já que o excesso de etanol prejudica o bom funcionamento dos órgãos, e o consumo de sal durante as "bebedeiras" (petiscos, churrascos e antepastos), piora o quadro clínico.

Atendo pacientes alcoolistas que sofrem de hipertensão arterial. Um deles, é o Sr. Norberto (nome trocado). Sua pressão é sempre verificada e houve um curto período no qual ele ficou abstinente, mas a aferição mostrava 16x10. Tudo indicava que, apesar de não estar fazendo uso do álcool, ele não estava se medicando para o controle da pressão. Questionado, ele confessou que não estava tomando seu remédio. Após orientação e consentimento, foram agendadas as consultas de rotina para as próximas semanas.

O paciente faltou no psiquiatra. Faltou no grupo terapêutico. Faltou na enfermagem. Faltou no clínico. Faltou na oficina de atividades... Eis que, um dia, ele aparece na unidade, alcoolizado e bastante animado:

- Ô minha princesa!
- Ai, Sr. Norberto...
- Você não é uma princesa?
- Por favor, Sr. Norberto!

E saí "de fininho" para que a recepção o atendesse. Quando retorno, minha colega da recepção explica a situação, que é uma constante em meu trabalho: o paciente tem recaída, perde as consultas e volta querendo retomar o tratamento. Mas, para isso, ele precisa passar primeiro... pela enfermagem. Prontuário do paciente na mão e lá vou eu.

- Sr. Norberto!
- Oh, quem me chama? É minha princesa?
- Para com isso! Senta aqui pra mim, por favor.
- Vou contar a história da minha vida para você agora.
- Não, Sr. Norberto. Espera um pouco, deixa eu falar.
- Deixo desde que me deixe. Hahaha!
- O senhor teve recaída, deixa eu ver... pela terceira vez, Sr. Norberto. Esta última foi quando?
- Uma semana. Fazer o quê? A vida nos leva para condições estranhíssimas... que estão longe do nosso controle.
- Falando em controle, o senhor não deve fazer uso de bebida alcoólica. O senhor é hipertenso, toma remédios, está em tratamento para dependência...
- Não estou tomando remédio.
- E eu não sei!? Se o senhor estivesse tomando todas as suas medicações direitinho, não teria tantas recaídas. O senhor toma o remédio como bem quer, quando quer, não pode... Precisa dar uma chance pro tratamento, Sr. Norberto.
- Tá bom.
- Senta naquela cadeira pra eu aferir sua pressão.
- Hummmm... Aferirrrrrrr!
- Não tem graça.
- Seu perfume é como um campo de flores!
- Fica quietinho agora, senão, não ouço nada.
- Pssst!
- Mas é muito sortudo... Deu 12x8.
- Deu 12x8 porque você é maravilhosa!
- O que o senhor fez?
- Vim te ver!
- Para com isso. É muito sério, Sr. Norberto. O que o senhor fez?
- Eu tomo o remédio da pressão.
- Está tomando desde quando?
- Pra poder beber, há uma semana!

E, assim, muitos pacientes alcoolistas que estão em tratamento - e usuários de outras drogas também - vão administrando a dependência química e o uso das medicações: contando pequenas mentiras e omitindo informações cruciais, na tentativa de engabelar o profissional de saúde.

Na mentalidade do Sr. Norberto, tomando o hipotensor - a medicação que baixa a pressão - ele pode, então, beber à vontade. Uma lógica imaginativa que ele criou para enganar a si próprio. Como se sua saúde fosse um joguete, Sr. Norberto brinca com suas artérias como brinca comigo.

Notas relevantes (mercado das drogas)

Preço base das drogas na capital de SP:
  • Cocaína - 1 pino (quatro carreiras) - $ 10
  • Crack - 1 pedra (duas cachimbadas) - $ 5
  • Maconha - 1 baranga (três cigarros) - $ 5